Estavamos todos tranquilos, sentados lá na sala de espera do consultório, quando chegou um cara olhando pro teto, teve um pouco de dificuldade pra chegar até o balcão da recepcionista, conversou um pedaço com a moça, entregou os documentos e foi se sentar na minha frente. Passou mais um tempo olhando pro teto, praticamente todo mundo na sala fez o mesmo, curiosos pra ver se tinha algo por lá, num tinha nada de mais, tudo normal. Depois, chegou um momento que não aguentou mais, vai saber quanto tempo ele tava com o nariz apontado pra cima. Quando ele baixou a cabeça, foi aí que todos perceberam, o cara tava com uma rinite braba, muito líquido saia do nariz. E pensar que antes ele tava engolindo aquela secreção, eca! Vai ver ele tinha passado por vários consultórios e finalmente chegou no do melhor otorrinolaringologista da cidade. Enfim, era tanto líquido que saia, que as cavidades nasais do cara não davam conta, tava saindo até nas lágrimas dele, só um herói pra suportar tanto... tanta nojeira. O otorrino tinha que atendê-lo com urgência, tava na cara e no nariz, nem liguei quando a atendente informou que um paciente iria tomar a vez de todos. Só podia ser ele, o cara da rinite, era fato consumado. Preocupada com a sujeira na sala, a moça da limpeza providenciou um balde pra conter aquela secreção toda. Chegou a ser tragicômico ver o cara segurando um balde próximo ao rosto e o som daquele líquido tocando o fundo da balde, depois era o som de muco pingando em muco, o balde já tava cheio até a metade. Finalmente, o médico terminou com o paciente que tava atendendo e o rapaz foi chamado. Já era sem tempo, a turma da sala de espera não aguentava mais ver a cena, era muito asco e trágico, o cômico já tinha passado, algumas pessoas tavam enguiando. Pense num alívio. Só tem um detalhe, no momento em que a recepcionista chamou o cara, naquele instante, pude perceber que a boca dele tava fechada e, mesmo assim, deu pra escutar ele respondendo o chamado, dizendo que tava se encaminhando. Notei até os olhos dele mais esbugalhados, demonstrando um espanto momentâneo. Depois de uns dez minutos, o cara saiu aliviado, não precisava mais do balde, muito menos de olhar pra cima, saiu com um sorriso meio abestalhado no rosto. Dirigiu-se à recepção, assinou os papéis, pegou os documentos e foi embora. Instantes depois, abriu a porta e colocou apenas a cabeça pra dentro da sala, com a boca fechada e ostentando aquele sorriso no rosto, falou, boa tarde a todos e obrigado. A turma toda na sala de espera ficou espantada, o cara falou e não foi pela boca. Umas senhoras bem céticas já foram logo comentando, deve ser ventríloquo. Concordamos por concordar, porque a dúvida pairava na cabeça de todos no consultório.
Semanas depois, tratado de minha amigdalite, vi a propaganda na televisão, aquele mesmo cara, o da rinite, apareceu calado, depois olhou pra gente e começou a falar de boca fechada, só podia ser uma montagem, mas foi justo o que ele disse, não era montagem, ele não falava pela boca, mas, devido a uma rinite crônica, desenvolveu uma técnica pra falar pelo nariz e estaria hoje dando uma palestra com entradas a preço de custo em um dos auditórios da cidade, ensinando essa técnica inovadora, bastante útil para aqueles que, por exemplo, são ventríloquos ou gostam de falar enquanto estão mastigando. Isso seria algo excelente para os maleducados que falam com a boca cheia e poderia ser o momento em que teriamos vários ventríloquos novos pela cidade. Uma ideia de gênio. Dito e feito, meses depois, o cara da rinite tava rico, aparecia em tudo quanto era programa televisivo, ensinava umas técnicas simples ao vivo, como falar as vogais pela narina direita e algumas consoantes pela narina esquerda. Em uma das suas aparições, o cara da rinite falou, pelo nariz, obviamente, que estava desenvolvendo uma técnica para falar pelo nariz e pela boca ao mesmo tempo, seria possível fazer um jogral de uma pessoa só, incrível.
A moda pegou mesmo, pegou tanto que surgiram novas regras de etiqueta, uma delas é, não fale pelo nariz quando estiver gripado, corre-se o risco de ir catarro pra todo lado. Apesar de todos os pesares, relutei um pouco em participar de uma dessas palestras, não fui de início, não sou de seguir tendências, mas não tive pra onde correr, cá estou eu, falando pelo nariz e com um broche que ganhei, o qual contém os dizeres, “quer falar pelo nariz? pergunte-me como”.
Linkar praquela charge que fiz: "fale pelo nariz - pergunte-me como". sacou?
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