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sexta-feira, 21 de outubro de 2011

aranha

De Betomenezes


veio
ressu-
reta à
veia

imer-
(feito)
-gente

reta
qual'arqui-
teto

do chão
prendeu
a preia
à teia

catre
do végeto
fogo que
nem Frida
ateia

Inseti-
(inserto)
-cídio

sombria
candeia:

veneno
que leva
o lume
e o som-

breia

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Inquietude


"
Não tenho sonhos que me abrem os olhos
Tenho tormentas que me dormem pesadelos...
 
"
Mirtes Waleska Sulpino
*Todos os direitos reservados ao autor

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

falha trágica



Olívia está de volta. Chove forte no dia de sua chegada. Do aeroporto ao bairro onde mora, Olívia observa ruas de forma analítica como se quisesse aprender de novo uma lição antiga. Olívia mudou por dentro e por fora. Engraçado como ausências causam mudanças. Ela sorri displicente enquanto o carro passa veloz pelas praças e avenidas. Nada muda na cidade. Eu mudo, pensa Olívia. Feliz e abobalhada, louca para chegar a sua casa e ver suas coisas, seus objetos, seus móveis, seus pertences e, talvez, receba boas vindas. O corpo de Olívia vibra de excitação ao pensar que talvez receba visitas. Talvez alguém tenha preparado festa e terá vinho e amigos questionando novidades. Olívia contará tudo de sua viagem. Dirá da grande experiência e das pessoas que conheceu. Provavelmente irá inventar detalhes, colocar adjetivos em seus devidos lugares, soberba exibirá fotografias que ilustrem seus passeios e grande será o fingimento ao dizer que conheceu alguém que mudou sua vida para sempre. Olívia dirá que conheceu um mundo extraordinário enquanto esteve ausente. Mentir faz a gente viver mais contente. É como se a invenção acontecesse quando a despertamos de nossa imaginação. Eu crio um mundo diferente no qual eu possa andar indiscreta e ainda ser eloquente sem dar uma palavra. E agora chove e Olívia se encanta ao ver pessoas buscando abrigo sob portas de lojas, telhados, árvores. Todos buscam proteção. É impressionante como somos todos iguais. Pensativa, Olívia sequer percebe a água invadir as ruas deixando os carros mais lentos devido a um imenso engarrafamento. É tempo de pensar. Pensa tanto que acredita que terá mesmo festa e sabe que ao chegar ao seu prédio dará de cara com o porteiro ouvindo no rádio transmissão de jogo de futebol. Sabe que irá saudar o homem e dirá bom dia e encontrará crianças brincando no play e terá de cumprimentar senhores no elevador. A vida é contínua, curva sempre em linha reta e nunca sai da ordem rotineira de sua política. Olívia encolhe seu corpo no banco de trás porque sente ternura, afeto, vontade de viver infinito cada dia que virá. Ela tornou-se tão otimista que jura não mais entrar em combustão por seus pequenos problemas de tempos atrás. Sequer os relembra. Sabe apenas que sentiu necessidade de um tempo para si mesma e foi, de pé na estrada, buscar esquecimento. E agora está de volta. Olívia desce do carro em frente ao prédio onde mora. Malas estão sempre prontas para serem desfeitas. Ela observa a cena. Crianças brincam risonhas estridentes, o rádio do porteiro é impertinente, velhos capengam na porta do elevador e, do alto, no oitavo andar, seus amigos acenam da varanda para receber Olívia de portas abertas para sua vida. Mas algo corrompe o enunciado. Olívia entra no carro, pede ao motorista que a leve para longe daquela gente e some feito folha solta em água corrente. Ainda não estava pronta para ser a mesma mulher de ontem. E assim é a vida, confusa acrobata desinibida, muda itinerários, recria personagens e decide não mais remontar velhos cenários. 




 (Por Letícia Palmeira)

Rinite Crônica


Estavamos todos tranquilos, sentados lá na sala de espera do consultório, quando chegou um cara olhando pro teto, teve um pouco de dificuldade pra chegar até o balcão da recepcionista, conversou um pedaço com a moça, entregou os documentos e foi se sentar na minha frente. Passou mais um tempo olhando pro teto, praticamente todo mundo na sala fez o mesmo, curiosos pra ver se tinha algo por lá, num tinha nada de mais, tudo normal. Depois, chegou um momento que não aguentou mais, vai saber quanto tempo ele tava com o nariz apontado pra cima. Quando ele baixou a cabeça, foi aí que todos perceberam, o cara tava com uma rinite braba, muito líquido saia do nariz. E pensar que antes ele tava engolindo aquela secreção, eca! Vai ver ele tinha passado por vários consultórios e finalmente chegou no do melhor otorrinolaringologista da cidade. Enfim, era tanto líquido que saia, que as cavidades nasais do cara não davam conta, tava saindo até nas lágrimas dele, só um herói pra suportar tanto... tanta nojeira. O otorrino tinha que atendê-lo com urgência, tava na cara e no nariz, nem liguei quando a atendente informou que um paciente iria tomar a vez de todos. Só podia ser ele, o cara da rinite, era fato consumado. Preocupada com a sujeira na sala, a moça da limpeza providenciou um balde pra conter aquela secreção toda. Chegou a ser tragicômico ver o cara segurando um balde próximo ao rosto e o som daquele líquido tocando o fundo da balde, depois era o som de muco pingando em muco, o balde já tava cheio até a metade. Finalmente, o médico terminou com o paciente que tava atendendo e o rapaz foi chamado. Já era sem tempo, a turma da sala de espera não aguentava mais ver a cena, era muito asco e trágico, o cômico já tinha passado, algumas pessoas tavam enguiando. Pense num alívio. Só tem um detalhe, no momento em que a recepcionista chamou o cara, naquele instante, pude perceber que a boca dele tava fechada e, mesmo assim, deu pra escutar ele respondendo o chamado, dizendo que tava se encaminhando. Notei até os olhos dele mais esbugalhados, demonstrando um espanto momentâneo. Depois de uns dez minutos, o cara saiu aliviado, não precisava mais do balde, muito menos de olhar pra cima, saiu com um sorriso meio abestalhado no rosto. Dirigiu-se à recepção, assinou os papéis, pegou os documentos e foi embora. Instantes depois, abriu a porta e colocou apenas a cabeça pra dentro da sala, com a boca fechada e ostentando aquele sorriso no rosto, falou, boa tarde a todos e obrigado. A turma toda na sala de espera ficou espantada, o cara falou e não foi pela boca. Umas senhoras bem céticas já foram logo comentando, deve ser ventríloquo. Concordamos por concordar, porque a dúvida pairava na cabeça de todos no consultório.

Semanas depois, tratado de minha amigdalite, vi a propaganda na televisão, aquele mesmo cara, o da rinite, apareceu calado, depois olhou pra gente e começou a falar de boca fechada, só podia ser uma montagem, mas foi justo o que ele disse, não era montagem, ele não falava pela boca, mas, devido a uma rinite crônica, desenvolveu uma técnica pra falar pelo nariz e estaria hoje dando uma palestra com entradas a preço de custo em um dos auditórios da cidade, ensinando essa técnica inovadora, bastante útil para aqueles que, por exemplo, são ventríloquos ou gostam de falar enquanto estão mastigando. Isso seria algo excelente para os maleducados que falam com a boca cheia e poderia ser o momento em que teriamos vários ventríloquos novos pela cidade. Uma ideia de gênio. Dito e feito, meses depois, o cara da rinite tava rico, aparecia em tudo quanto era programa televisivo, ensinava umas técnicas simples ao vivo, como falar as vogais pela narina direita e algumas consoantes pela narina esquerda. Em uma das suas aparições, o cara da rinite falou, pelo nariz, obviamente, que estava desenvolvendo uma técnica para falar pelo nariz e pela boca ao mesmo tempo, seria possível fazer um jogral de uma pessoa só, incrível.

A moda pegou mesmo, pegou tanto que surgiram novas regras de etiqueta, uma delas é, não fale pelo nariz quando estiver gripado, corre-se o risco de ir catarro pra todo lado. Apesar de todos os pesares, relutei um pouco em participar de uma dessas palestras, não fui de início, não sou de seguir tendências, mas não tive pra onde correr, cá estou eu, falando pelo nariz e com um broche que ganhei, o qual contém os dizeres, “quer falar pelo nariz? pergunte-me como”.

Linkar praquela charge que fiz: "fale pelo nariz - pergunte-me como". sacou?

profanoração (thiago/outubro)


profanoração



pai nosso, ora bolas
onde estás?
no céu ou na boca
das velhas carolas
ou te entocas
em vis pedestais?

santificado, não sejas
poeta de nome maldito
pois sopraste no barro as cerejas
mas deixaste o licor interdito
            entretanto estas ervas que cheiras
            entorpecem teu mundo de absinto

não te metas no meu reino
nem me peças, por capricho
o sacrifício de um filho
            ou renúncia do recreio

que a terra seja o céu
e teus anjos
com trombetas
tocando anis punhetas
guarneçam o bordel

o pão nosso é nossa sina
cada qual procura o seu
e, por terem uns mais que outros,
uns aos outros assassinam
enquanto volves o rosto
nos largando neste breu

as ofensas que empenhamos
ao final compensaremos
com os rombos do teu banco
            só não queiras que durante
            a feitura desta dívida
            não caiamos aos montantes
nos prazeres da malícia

se assim fizeres acordo
cumpriremos nossa parte
sem alarde e com decoro

assim seja
bem aqui
                       e no além

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Microconto para Machado de Assis

 
para quando chegar minha vez.
 
 
A cartomante

Ela foi seca:

- Perdeste um filho aos dez meses de vida. Afogado. Ainda sentes muito, não?

Ele, desesperado, saiu sem pagar a consulta. Camilo acabara de completar nove meses e vinte e dois  dias.