As cortinas mofadas se abriram. Isso não é um conto. É só um amontoado de palavras, se alguma servir pra ti, meus pêsames. Só gostaria de acordar e sacar qual é a parada dessa galera moderna: instabilidade, baboseiras, línguas afiadas na rede, e bocas murchas na realidade. Sempre quis desequilibrar o jogo, chegar pra essa gente e dizer: “Todos temos planos, até levarmos um soco na boca.” Não tenho revolta com o mundo, apesar de ter sido fuzilado por um exército de garotos brancos e saudáveis quando pequeno. Apesar de papai ter quebrado dois dentes meus só porque não aprendi a andar de bicicleta.
“É só pedalar, filho de puta.”
E eu via o canino e incisivo voando.
Isso não me irrita.
Na verdade, eu só queria virar o tabuleiro. Cansei das merdas. Abobrinhas. Estou com vontade de cuspir verdades em suas bocas finas. Vocês falam demais, produzem de menos. Ter que ouvir uma poetisa lésbica falando merda de mim, sendo que escreve rimas do tipo “o amor é uma dor, o coração vacilou, minha calcinha se melou.” Porra mulher, vá se alfabetizar com o capeta. Aproveita e pega um bonde pra casa da sua mãe, aquela vaca parideira.
Eu não sou revoltado. Sério.
Vivo na rua. Um poeta das sacolas plásticas recheadas de restos humanos. Vivo no que você consome na mesa de jantar. Apesar de viver na escória, na ponta do cu da humanidade, afirmo: não tenho fúria. Tenho ímpeto. Nada me agride, mas tudo me atinge. Pessoas que desejam criticar, falar, pensar, sem sequer analisar os fatos me atinge. Ninguém é certeza, ninguém é 100% conservador ou 100% liberal.
Sou 100% conservador quando o assunto é bandido.
Sou 100% liberal quando o assunto é prostituição.
Sou 100% conservador quando o assunto é minha filha.
Sou 100% liberal quando o assunto é cigarro.
Não é simples? Mas não, as pessoas querem se afirmar como únicas. Vocês se entopem de chorume.
Amor e tumores, dessas substâncias que sou feito. Fui concebido pela vulva da Santa Mãe e expelido pelo reto do PAI CRISTÃO. Alimento-me de alfaces rasgadas, ossos de galinhas e jornais com peixes enrolados. Gorduras, caixas de sucos, revistas pornográficas com seus gozos. Gorduras do leitão de Natal, cascas de banana. Amo remexer o caos interior humanóide. Localizo massa abstrata de cabelos, baratas agonizando, cotonetes amarelados, latas de cerveja, palitos com pedaços de bife vermelho e marcas de batom. Janta de primeira.
Peguei os palitos e chupei: salgado. O gosto do alimento conseguiu nutrir o defunto que emergia em meus ossos. Outro dia de sobrevivência nesta cidade insone.
Sorrir para não transparecer loucura.
Sorrir para não transparecer a inquietude que sinto quando olho pra vocês.
Não sou furioso, sou teimoso.
Insisto em querer ajeitar uma coisa ou outra, explicar ou resumir a parada: tanto faz. Isso não precisa fazer sentido. Precisa atingir o alvo. Criadores egocêntricos desejam ser perfeitos, nunca erram e se afirmam como os melhores: seus egos fedem, seus corpos e mentes são mentiras maiores do que a brancura do Michael Jackson. Você, louca, pirada, trepadeira, pensa que um dia irá se achar? A saída para os seus problemas se encontra no topo de um prédio de vinte andares. A solução completa estará no térreo, quando a sua cabeça estiver enfiada no granito da sala de espera. E a roqueira metida à perfeita? Aquela que sabe tudo e tem certeza dos seus passos bambos, até se olhar no espelho e ver o quão degradante ela é. Vocês passaram no semestre da universidade? Nossa, que tal um suicídio coletivo agora?
Não tenho raiva, tenho manifestos.
Continuo catando meus lixos mentais e alimentícios, enquanto jorro palavras sem poesia ao vento.
O cuspe escorre na minha barba branca.
As cortinas se fecham. Fim do espetáculo. Se alguém se sentiu atingido ou incomodado ao ler, é porque foi pra você. Beijos e compartilhe essa porra na casa da sua avó mongolóide, diga que foi o Caio Lispector que escreveu.
Xoxo.