Árvore
Tétrica
Tive de
ir na feira, fazer a feira, comprar certas frutas, legumes e
verduras. No meio de toda aquela feira, tinha um rapaz com um boné
que escondia o rosto, escorado em uma das quitandas com um ar
misterioso. Passei perto dele e ele me chamou, perguntando se eu não
estaria interessado em algo diferente. Pensei logo em drogas, mas não
era isso, me mostrou três sementes verdes, afirmando que eram
mágicas. Achei uma baboseira sem tamanho, ainda mais pelo preço que
oferecia pela bagatela de três carocinhos pequenos e verdes,
cinquenta reais. O rapaz do boné disse que eu poderia pensar, eu não
iria me arrepender, iria me vislumbrar com o que brotaria daquelas
sementes. Continuei a fazer minhas compras, mas com a ideia das
sementes incrustadas na minha cabeça, criando raízes. Minha
curiosidade brotou e resolvi despender os cinquenta reais naquela
planta misteriosa. Fui lá no rapaz do boné, apresentei a nota de
cinquenta e pedi as semente, ele as me deu. Me chamou pra perto e
falou baixinho no meu ouvido o modo de plantio. Teria de plantar as
três ao mesmo tempo em um vaso marrom, regá-las com cuidado durante
três dias, no quarto dia, uma das sementes iria brotar e eu ficaria
estarrecido com o que veria. Conferi as sementes na minha mão,
quando olhei de volta, o rapaz do boné não estava mais no seu
canto, havia sumido. Voltei pra casa pensando nas minhas sementes
mágicas, três sementes, seria como João e o pé de feijão. Apesar
da cor verde, não se assemelhavam a feijão, teria o mesmo tamanho,
mas não. Será que no quarto dia acordaria com o telhado de casa
arrancado, o vaso destruido e uma grande árvore, ponte que me
levaria aos céus? Iria escalar toda aquela árvore, feito João,
encontraria um castelo fincado em uma núvem, um castelo de dimensões
gigantescas, onde moraria um gigante, enfrentaria o gigante, roubaria
seu ganso, ou pato, não lembro, que põe ovos de ouro e fugiria,
descendo o grande pé de feijão. Entretanto, isso é outra história,
uma fantasia já contada. Talvez que ao invés de uma grande árvore,
tivesse uma grande raiz, que cavaria terra adentro, até o centro do
planeta, levando-me a uma espécia de inferno, encontraria um guia,
Virgílio, que me guiaria pelos nove cantos do inferno real.
Entretanto, nos encaminhamos pra outra história já contada.
Plantei
as sementes num vaso marrom, segui o procedimento metodicamente,
reguei todos os dias, sem falta, com paciência, esperando pelo
quarto dia. Um pouco ansioso pra ver o que brotaria. Finalmente,
durmo do terceiro pro quarto dia. Sonhei me acordando pela manhã,
andava pela casa que parecia um pouco diferente, impressão de que
tudo era maior, o corredor se alongava, tardando meu encontro com a
planta vislumbrante. No momento que a encontrei, não a vi, acordei.
Não era mais imaginário, estava na realidade, me dirigi pro local e
lá visualisei a planta. De fato, foi vislumbrante, uma planta que
nunca havia visto. Uma árvore diferente, não destruiu telhado,
tinha cerca de um metro e meio de altura, crescimento instantâneo em
uma noite, e o vaso não quebrou estava intacto, nada de descer nas
profundezas do centro da terra. Sua cor era vermelha, sem frutos, seu
formato de linhas retas, fazendo curvas de noventa graus. Um único
tronco, conexo, sem ramificações. O formato me lembrou aquele jogo
de celular da cobrinha, não o jogo moderno, sim o clássico, de
tempos atrás, quando não se tinha cores nos aparelhos, apenas o tom
monocromático. Poderia dizer também que remetia ao tetris. Foi
assim que chamei-a: árvore tétrica. Dei um giro de trezentos e
sessenta graus ao redor da árvore, para observar melhor, por
incrível que pareça, independente do ângulo que olhasse, seu
formato era o mesmo, uma ilusão de ótica real, uma árvore
bidimensional.
Aproximei-me
daquela flora diferente, toquei-a e, pra meu espanto, virou pó, um
pó avermelhado, espalhou-se pelo chão da sala. Não fotografei, não
filmei e virou pó. Quem iria acreditar na minha história da árvore
tétrica sem nenhuma prova cabal? Uma grande decepção, depois de
tanto tempo esperando, tudo virou pó. Além do dinheiro
disperdiçado. No meu desespero, cavei em busca das sementes, estavam
intactas, conforme havia depositado no vaso. Respirei fundo,
angariando paciência e repeti o procedimento para que brotasse mais
uma vez. Nada feito, no quarto dia, nada de árvore tétrica. Tentei
mais uma vez, mas nada de novo. Desisti. Decidi passar as sementes
pra frente, iria recuperar meu dinheiro, meus cinquenta reais. Peguei
um boné qualquer e escondi o rosto, fui pra feira, fiquei no mesmo
ponto onde aquele rapaz do boné estava. Observava as pessoas,
analisando quem poderia se interessar por uma árvore tétrica.
Encontrei minha vítima, uma mulher com ar de curiosa. Dei o bote,
repeti a mesma ladainha que aquele rapaz do boné havia me dito. Ela,
a princípio, pensou que fosse uma cantada, depois, quando viu as
sementes na minha mão, viu que era sério, e resolveu comprar as
sementes, me deu o dinheiro e eu lhe disse o procedimento de plantio
e as entreguei na mão dela. Ao perceber que ela olhava pras
sementes, foi a deixa que precisei, sumi.